“Os porquês da necessidade de uma promessa alternativa para Ateus, Agnósticos e Livres Pensadores”

Por Andrigo Luçardo, Vice-presidente do 329º Grupo Escoteiro Voluntários da Pátria , Pelotas – RS

Hoje convido os estimados leitores a conhecer alguns dos porquês de divergirmos quanto à corrente majoritária que ventila a tese da essencialidade de Deus na promessa escoteira.

Quanto à existência de Deus é fato que a espiritualidade é uma tradição antiga do escotismo, extremamente importante e não deve ser extirpada do movimento, todavia não cremos seja isso essencial. Reparem que a cada lei escoteira é atrelado um ou mais valores, que devem se refletir no agir e no pensar dos escoteiros que prometeram cumprir tais normas. É certo, portanto, que não dá pra ser escoteiro sem necessariamente cumprir as leis, pois em última análise cada vez que cumprimos as leis estamos agindo segundo valores ou axiomas tidos por BP como fundamentais, tanto que insculpidos em leis escoteiras.

Dito isso podemos passar à análise da questão concernente à espiritualidade. Começamos com Descartes, francês fundador da filosofia moderna: “Dubito, ergo cogito, ergo sum” (Eu duvido, logo penso, logo existo), ou seja, questionando o pensamento por hora majoritário, podemos nos indagar se Deus e a espiritualidade (importantes, sem dúvidas) são realmente essenciais haja vista ambos não representam um valor em si e tampouco representam uma forma de agir, mas tão-somente uma forma de pensar, isto é, CRER ou não crer. Noutras palavras trata-se apenas de uma questão de opinião, de foro íntimo, pessoal, alheia à ciência. Ninguém é mais digno por crer em algum Deus ou praticar alguma religião, porém se alguém age no cumprimento da lei escoteira, logo, também no cumprimento dos valores escoteiros, certamente tal pessoa torna-se mais digna a cada vez que age de tal forma. Daí o porquê de podermos inferir, com segurança, que embora Deus e Espiritualidade sejam importantes não são essenciais à promessa escoteira, razão pela qual se faz necessária a criação urgente de uma promessa alternativa sem menção à palavra Deus.

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Aliás a espiritualidade não “está contida”, por assim dizer, na ciência, senão vejamos um resumo do método científico:

hipótese + teste = resultado.

Ex 1:

Hipótese: Deus existe (ou algum ser superior, ou força superior, desimporta a nomenclatura)

Teste: Não é possível.

Ex 2:

Hipótese: Minha esposa me ama.

Teste: Não é possível.

Resultado: se a hipótese não puder se se submeter ao teste não há ciência, há ficção científica! Não há realidade sob a ótica da racionalidade (busca da certeza por meio de demonstrações e análises). São meras CRENÇAS, hipóteses, teorias, conjecturas, suposições, “achismos”.

Compreendemos e respeitamos que muitas pessoas queiram crer em algo, mas milhões, como nós, não. CRER somente não nos basta, caríssimos, queremos SABER!

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Avanço.

O fato de alguém acreditar em Deus ou Duvidar de sua existência, não o torna inapto a seguir as 10 leis escoteiras, ao contrário do que muitos creem (mas não sabem).

O fato de a pessoa CRER ou NÃO CRER em Deus não ajuda em nada o mundo. Não muda nada para um escoteiro, nem o desabona. Em contrapartida cumprir ou não cumprir qualquer uma das 10 leis escoteiras sim pode fazer toda a diferença para a sociedade, compreendem?

É exatamente por isso que aventamos que a crença em seres superiores não é essencial, pois, por si, não deixa o mundo melhor ou pior, é indiferente.

Solução: deixar a promessa atual como está e criar uma promessa alternativa àqueles que não se sentem confortáveis com a atual, para que ateus, agnósticos e outras religiões se sintam incluídos. Então teríamos mais de uma promessa oficial? Sim, como a Inglaterra, que já conta com nada menos do que QUATRO promessas alternativas: a tradicional (católica), a hindu, a muçulmana e a humanitária (para os não crentes)

“Não podemos mudar o que disse BP” dizem os contrários à proposta.

A própria promessa atual não é a original haja vista que ela fala em dever com o REI e, por isso, demandou adequação. Se não pudéssemos mudar a promessa original, principal argumento daqueles contrários à promessa alternativa (uma nova que não modifica em nada a atual) chegaríamos à conclusão – lastimável – de que o escotismo só poderia ser aplicado em Monarquias, independentemente do tipo (parlamentar, absoluta, Constitucional Federal ou Constitucional Parlamentar). Isso significa que, hoje, somente 44 países poderiam tolerar escotismo em seus solos, o que, convenhamos, é um absurdo!

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Portanto, a promessa alternativa será tão-somente outra adequação com fincas à inclusão de jovens e que em nada vai mudar o escotismo, senão implicar em um crescimento vertiginoso no número de de jovens ávidos por aventuras, desafios e saberes mil, como ocorreu na Inglaterra que teve a maior adesão dos últimos 20 anos ao adotar a promessa alternativa.

Unamo-nos pelas parecenças ao invés de nos apartamos pelas divergências!

12 respostas em ““Os porquês da necessidade de uma promessa alternativa para Ateus, Agnósticos e Livres Pensadores”

  1. Não vejo comentários aqui a tempos! Mas sonho com o dia que meu grupo escoteiro onde fiz minha promessa pela primeira vez quando tinha apenas 11 anos me aceite como agnóstico que me tornei. Tenho três itens da promessa tatuados no meu pulso esquerdo, cortesia amizade e lealdade. Assim como uma grande flor de lis no meu ombro direito! Sempre serei escoteiro pela promessa que fiz, mas como adulto refleti sobre minha existência e não posso prometer sobre algo que não acredito pois deixaria de cumprir com promessa como e redigida hoje. Amo o escotismo e devo a ele valores que nem mesmo em casa encontrei! Obrigado por pensar diferente! SAPS. O mundo com certeza seria um lugar melhor se houvessem mais escoteiros!

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  2. Olá, esse final de semana estive em um congresso pioneiro e tive o contato com a ficha técnica “Escotismo e crença em Deus”, achei muito problemática várias parte e apesar de já ter um pensamento pré formado contra a posição da UEB perante ateus e toda essa questão de ter “Deus” em progressão e principalmente na promessa, quis me aprofundar mais sobre o assunto e estou ainda a procura disso para que não tivesse uma opinião superficial e pudesse ver os dois lados.
    Procurando, me deparei com seu artigo e realmente me senti contemplada visto que já eram ideias que tinha e pude complementar mais e obter novas informações. Acredito muito no movimento escoteiro e na importância que ele tem na vida de quem participa do mesmo, por isso quero fazer com que ele possa sempre progredir e abranger a todos e com esse posicionamento e colocações já que há, por exemplo,o tema de 2016 “Diversidade que nos une” que apesar de ser tão bonito e acolhedor se torne até contraditório, já que por um lado diz que a diversidade nos une e por outro “ cada associação tem total liberdade de decidir se quer ou não a filiação de alguém como associado. Nisso não reside, em absoluto, qualquer tipo de discriminação ou preconceito!” (parte tirada da ficha técnica “escotismo e crença em Deus”) dando a possibilidade da associação de excluir um membro apenas pelo fato de ser ateu.
    Embora eu não seja ateia e sim agnóstica, lutar pelo direito dos outros terem ou não sua crença também cabe a mim e por isso estou tão determinada a me aprofundar no assunto e fazer com que isso possa ser minimamente conhecido e espero, que mudado.
    De antemão, agradeço pela sua contribuição. Bravo, bravo, bravissímo

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    • Fico IMENSAMENTE feliz com teu comentário, caríssima!

      Mas me conte mais!!! SETE anos e já temos um livre pensador? Oo
      Me conta como é/foi/está sendo isso!!

      Abração! SAPS

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  3. A WOSM ( WORLD ORGANIZATION OF THE SCOUT MOVEMENT da sigla em ingles6) , que congrega a maioria das associações escoteiras do mundo, afirma no documento
    “Diretrizes para o desenvolvimento espiritual e religioso” que
    ” (…) A espiritualidade também é usada para se referir ao espírito humano, ao surgimento do verdadeiro eu. Pode ser expressa em forma de religião, agnosticismo e ateísmo. (…).

    A partir deste posicionamento, outros países, como Finlândia, Dinamarca, Macau, Países Baixos, República Checa, Suíça, Israel – para citar apenas alguns – ABOLIRAM OU JAMAIS TIVERAM ÓBICE À ACEITAÇÃO DE ATEUS, sendo que , em todos eles, a menção a Deus não consta na Promessa.

    Concluindo:
    Não há como ” construir um mundo melhor”, com preconceitos, segregação e falta de diálogo. Passamos do tempo de definir que a ausência de crença em deuses, assim o como sexualidade, não define o caráter de ninguém.
    Para ter percepcoes transformadoras sobre a natureza da nossa existência, o CAMINHO TAMBÉM ESTÁ NO CONHECIMENTO CIENTÍFICO. Espiritualidade está intimamente relacionada com a VERDADE. E tal visão nos inequivocamente à CIÊNCIA. E isso, portanto lembra o cientista Albert Einstein ” ainda assim é a coisa mais preciosa que temos”.

    Um ateu ou agnóstico pode não apenas ter espiritualidade, mas pode ter um tipo de espiritualidade mais informada, em que você consegue a resposta para questões que outros acham misteriosas, e formula perguntas que poucos ousaram perguntar. Um irreligioso, ateu ou cético livre pensador ou humanista secular moderno conquista uma LIBERDADE onde um ser humano crente jamais vai descobrir ou seja verdades jamais imaginadas.

    Com um pouquinho de esperança de um mundo melhor,
    Oiced Mocam
    Porto Alegre/RS.

    http://livrodeusexiste.blogspot.com.br

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    • Muito bem lembrado, meu caro!!

      Cerca de um ano após eu escrever o artigo acima acabei me afastando do Escotismo, magoado com a forma através da qual a UEB lida com essa questão. Muito embora ela vista o manto da ‘diversidade’, exala o fedor da ‘segregação e indiferença’ em alguns aspectos, como este.

      Grande abraço!!

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  4. Essa questão é muito pertinente, mas eu optaria por uma outra interpretação. Não se mudaria coisa alguma no conteúdo da Promessa Escoteira e sim numa ampliação da interpretação de Deus. Pois a interpretação original e que perdura até hoje é de Deus das religiões abraâmicas ou similar. Podemos argumentar uma espécie de Tese do Budismo visto que o Budismo já se consagrou também como uma religação com as forças de explicação do Mundo Natural. Desta forma, para o ateu há sim um “Deus” (não pessoal) que justifica uma espiritualidade tão digna e legítima quanto às das demais religações teístas já abarcadas pela interpretação escoteira tradicional.

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